Friday, February 23, 2007

 

coluna 22 de fevereiro

SALVE O ASTORIA

Uma tragédia esta pra acontecer em Londres. Chamem isso de desenvolvimento ou progresso. Pra mim é tragédia. O legendário London Astoria, a casa de shows mais legal de Londres, ali no centrão da cidade, esta aparentemente com os dias contados. Há um projeto para aumentar a estação de metrô Tottenham Court Rd, acrescentando linhas de trem suburbano, e o Astoria seria demolido para que a obra pudesse ir em frente. Isso não é lamentável?




Afinal, o espaço é o mais tradicional de Londres. Não consigo ver Londres sem o Astoria. Assim como não consigo enxergar Londres sem o Big Ben. Simplesmente é intolerável a possibilidade de demolirem o Astoria. Por que não demolir o quarteirão vizinho? Por que não conservar esse patrimônio cultural, por quais tantos artistas já se apresentaram? Não é justo.

Mas a fé é a ultima que morre. Neste exato momento, há muitas outras pessoas que também estão com o coração apertado devido ao possível fechamento do Astoria, incluindo diversos artistas e bandas. Foi criado um movimento "Save The Astoria", onde há um abaixo-assinado, assim como informações, opiniões e artigos de jornais sobre o assunto. Vá ao site e assine já a peticão para salvar o Astoria: http://www.savetheastoria.org/

Se os roqueiros do planeta se unirem, o projeto para as obras do metro pode encontrar dificuldades. Há dois anos atrás queriam fazer a mesma coisa com o Electric Ballroom em Camden. Esse espaço também é tradicionalíssimo. Fizeram uma campanha e conseguiram salvar a casa, convencendo a companhia do metrô a fazer a obra em outro local.

Muitas bandas já passaram pelo palco do Astoria. Das clássicas as mais obscuras. Só nessa década, a lista é grande: Rolling Stones, U2, Madonna, Oasis, Coldplay, Keane, Arctic Monkeys, Slayer... todos os pesos pesados já pisaram lá. Acho que todas as bandas, quando alcançam fama mediana, acabam tocando por lá. É tipo um espaço obrigatório. Elas próprias exigem que seus agentes marquem concertos no Astoria. Sem contar que o lugar é imundo, fedorento, escuro, mórbido. Típica casa de rock.

Desde que estou morando aqui, já vi shows históricos por lá, que ficarão na minha memória pro resto da vida. O mais marcante foi Libertines em 2004, com Pete & Carl, no show contra o racismo. Possivelmente esse foi o mais emocionante da minha vida. Tocaram os dois álbuns do Libertines inteiro, e ainda no final apareceu Mick Jones do Clash para tocar “Should I Stay Or Should I Go” com os Libs. Foi nesse dia que vi quão potente é presença de palco do Pete. Sem contar que nos intervalos das musicas rolavam protestos contra os partidos racista e nazistas. Toda vez que assisto esse show em dvd (pra isso que serve o ebay, para comprar raridades como essa), eu choro.

Além dos Libs, assisti My Morning Jacket numa apresentação de gala. Nesse dia quem abriu foram os animados Junior Senior. Nessa noite me acabei. Não posso esquecer também do dia em que o Hot Hot Heat pos fogo no Astoria, tocando seu primeiro álbum por completo, hit atrás de hit. Sai do Astoria rouco, feliz, bêbado. Franz Ferdinand fez igualmente um ótimo show. Recentemente, me deliciei com Guillemots e My Life Story. E a primeira vez que entrei no Astoria foi para assistir o Ladytron, em 2003. Fofo. E o Suede, minha banda predileta de todos os tempos? Escolheu o Astoria para o ultimo show da carreira, e eu estava presente, chorando, triste, feliz, vivenciando aquele momento histórico.

E veja só, eu já fui DJ no Astoria. Uma noite inesquecível e turbulenta, conhecida como "A RIOT IN LONDON TOWN". Tudo começou quando esse humilde escriba trombou com Pete Doherty na rua. Chamei ele, ele veio. Me cumprimentou, começamos a conversar. Seu manager James Mullord estava junto. Eu disse que era um grande fã dos Libs e Babyshambles. Pete agradeceu e tirou da sua bolsa o single de "Killamangiro" e me deu. Como se nao bastasse, me deu o single em vinil também. Fiquei muito feliz; aquele single seria lançado somente dali a duas semanas.

Pete perguntou o que eu fazia aqui em Londres. Eu disse que fazia um monte de coisas e uma delas era DJ. Ele ficou contente com o fato de eu ser um DJ, e me chamou para discotecar na noite de natal que os Babyshambles fariam no Astoria, em dezembro de 2004. Nessa época, os Babyshambles estavam no auge da forma, tocando o que possivelmente era um dos melhores shows desse planeta. Claro que aceitei, ele me deu o fone do seu tour-manager e pediu para entrar em contato. Oh, que figura cândida esse Pete Doherty.

Chegou o dia do show, lá fui eu com meus disquinhos animar a galera entre os muitos shows que rolariam naquela noite. Acho que nunca discotequei para tanta gente: 2 mil pessoas. E veio a primeira banda, a segunda, a terceira, a quarta, e eu metendo som entre elas. A quinta seria o Babyshambles. E espera meia hora, uma hora, duas horas, três horas e nada do senhor Pete Doherty aparecer. Ainda bem que sou prevenido e levei bastante musica pra tocar. E fiquei lá eu, tocando meus sons e o publico se enfurecendo com o perdido do Pete. Deu 3 da matina, já era, a galera subiu no palco e quebrou tudo, destruindo instrumentos, equipamentos, batendo em seguranças, atirando garrafas, fazendo arrastão. Desastre total. Uma autentica riot. Queriam até mesmo invadir a cabine do DJ e me rapelar. Sorte que a policia chegou antes que isso acontecesse. Depois que o Astoria foi esvaziado, finalizei meu set. E esse foi o dia em que fui DJ no Astoria. Noite maluca, que mesmo sem Pete, foi uma experiência mágica.

Mas enfim, muitas experiências mágicas provavelmente não acontecerão mais se o Astoria realmente for fechado. Por isso, pare de ler esse texto agora e assine o abaixo-assinado para salvar o Astoria: http://www.savetheastoria.org/

Mais informacoes: http://www.myspace.com/savingtheastoria

VIDA LONGA AO ASTORIA!


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Resolvi traduzir um texto essa semana. Um texto que adorei, escrito pelo mestre Everett True, onde há uma boa tirada sobre os clássicos. Veio como editorial do novo número da revista Plan B, e mais abaixo vão meus comentários.

"Hoje ouvi um disco do Stooges pela primeira vez. Cara, me senti mal, como se tivesse traído minha fé sagrada. Na minha casa sempre teve uma regra principal, tá ligado – Não Stooges, e nem Rolling Stones. Nunca tive nada contra ambos os grupos, apenas as pessoas que endeusavam eles. Um sujeito pode escutar música sem preconceito; não eu. Pra mim, música sempre foi mais que um mero som. É a escolha de um estilo de vida, uma manta de segurança, uma maneira de sonhar, violeta e carmesim e escarlate, o império sobrenatural. Os Stones e Stooges eram uma maldição pra mim: a idéia do rock como rebelião e perigo quando claramente era o oposto. Pior ainda, eram de antes do meu tempo. (Você tem que compreender a condições nas quais eu cresci. O Punk realmente reforçou a noção de ser um Ano Zero – 1976).

Me lembro de quando o ex-amigo Alan McGee mandou uma peçonhenta carta para a NME em 1986, reclamando de uma resenha minha para um ridículo single do Iggy Pop (“Real Wild Child”), apontando que os Stooges encapsularam o rock’n’roll. Que melhor razão para evitar e insultar eles? Rock’n’Roll era uma merda – ginástica com outro nome: uma criação masculina que por sua natureza excluía metade do mundo.

Ainda. Eu não poderia evitar o fato de que duas das minhas favoritas bandas ao vivo – The Birthday Party nos anos 80 e Mudhoney nos anos 90 – pegavam o blues berrante e feroz do Stooges como suas bases, e mimavam as danças do Iggy Pop. Eu pegava essa desculpa pra mim mesmo: música ao vivo é contexto, o tempo e espaço em que existe importa mais que qualquer outra coisa. Eu resmungava, me recusando a encarar a contradição. Talvez os Stooges tivessem sido legais uma vez. Outra época, outra geração, outras regras. Eles que se fodam. Eu ainda não gostava daqueles músicos e ‘fãs’ de música gordos e cabeludos que referenciavam eles. “I Wanna Be Your Dog”, “Loose” e “1969”... clichês que se tornaram impotentes pelo uso excessivo.

Os tempos mudam. O rock – como até mesmo a NME tardiamente percebeu, uma década depois que todo mundo – é agora um tanto cool, principalmente porque não é mais aquela besta patriarcal que um dia foi. Eu posso ouvir um disco do Stooges sem preconceito. Posso? Tem um novo sendo lançado agora em marco, “The Weirdness”, o primeiro deles em 33 anos. Hora de ouvir. Jesus, soa como os Ramones! Jesus, soa como Sonic Youth (particularmente a zuada “You Can’t Have Friends”). Jesus, soa como Mudhoney! Jesus, é sujo e infantil e malvado e todas aquelas descrições que tanto adoro de dar para musica que eu gosto. Jesus, é ok. Há algumas faixas esquisitas, descartáveis e paradas, onde Iggy resmunga como um péssimo cantor de pub... mas é ok. Acho as letras - rimas banais, óbvio que não poderiam vir de adolescentes, e sim de um bando de cinquentões – de fácil compreensão, mas... é ok. Quem iria imaginar?"



Esse texto despertou novamente em mim aquela história de acreditar naqueles discos ou bandas que todo mundo diz que são clássicos. Eu nunca dei a mínima para os clássicos. Filmes, discos ou livros.

Claro que cada pessoa passa por uma situação diferente na vida. No caso de Everett, sempre teve sua birra com Stones e Stooges. Eu não. Escutava eles numa boa. Afinal, se eu fosse ignorar tudo que surgiu antes da minha época, estaria perdendo coisas legais, não poderia evitar.

Mas aconteceu comigo algo semelhante nos meus anos de adolescência com outro grupo. Cresci numa época em que todos ao meu redor cultuavam Echo & The Bunnymen. Eles eram os intocáveis. Os superiores. Eu sempre os ignorei. Novamente, não era nada contra a banda, mas sim o povo que cegamente os endeusavam. Só depois de marmanjo é que fui botar meus ouvidos nos álbuns do Echo & The Bunnymen, e constatei que realmente eram bons, mas não significavam nada pra mim. Jamais farão diferença pra mim.

Ainda posso citar um caso ‘oposto’. Quando deixei de gostar de uma banda. O nome dela? Placebo. Sou um grande fã do primeiro álbum do Placebo. Acho aquele disco estupendo e definitivamente marcou minha adolescência. Depois veio o segundo álbum e a qualidade já não era mais a mesma. Inexplicavelmente, foi com esse disco que a base de fãs da banda aumentou absurdamente. De repente, qualquer Zé Mané com cérebro vazio brincava de ser Brian Molko. Fingiam ser andróginos, quando mais pareciam uns palhaços. Sei lá, tipo... isso fez com que eu ficasse com raiva do Placebo. Musicalmente, ainda os respeitava, mas como disse Everett, música não é a apenas som, é um estilo de vida. A partir do momento que esse povo de cabeça vazia começou a ouvir Placebo, eu passei a ignora-los. Simplesmente esqueci que existem.

Resumindo, nunca ache que algo é bom simplesmente porque todos seus amigos acham. Sempre desconfie daquilo que é unanimamente adorado. Se todo mundo cultua uma certa banda, com certeza algo deve estar errado com ela, você não acha? O que importa é seu instinto e a situação pelo qual você passou a ter uma relação com determinada banda ou disco. Aquelas listas dos discos clássicos que você precisa ouvir são puro lixo. Ignore-as e siga seu próprio caminho. Faca sua própria lista.

Everett True é jornalista e escritor, foi quem apresentou Courtney ao Kurt, escreveu livros sobre os Ramones, Nirvana e foi escriba dos semanários ingleses nos anos 80 e 90. Editou algumas revistas nessa atual década e atualmente é o patrão da Plan B. O cara é foda.

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xx



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